domingo, 28 de novembro de 2010

O quadro não preenchido


Ivo Lopes Araújo já assinou alguns trabalhos notáveis como diretor de fotografia. Com Petrus Cariry, tem uma parceria criativa que resultou em “O Grão”, “Dos Restos e das Solidões” e “A Montanha Mágica”. Com a mineira Marília Rocha, cofotografou “A Falta que me Faz”. Com os colegas cearenses da Alumbramento, codirigiu “A Amiga Americana”.

Aqui no Festival de Brasília, o cearense participa do festival como fotógrafo do mineiro “O Céu Sobre os Ombros”. Um filme sobre três personagens de classe média baixa que buscam preencher suas vidas.

Esperava mais, confesso. Há cenas bonitas para os olhos, com a câmera parada congelando a presença dos atores no quadro como em uma pintura. Mas, poxa, o roteiro poderia avançar um pouco mais.

O filme parece ficar naquilo que o crítico baiano André Setaro identificou na dicotomia entre forma e conteúdo, “o que se conta” versus “como se conta”. O resultado de “O Céu Sobre os Ombros” dá a impressão de que o segundo é mais importante do que o primeiro.

Discordo que haja uma rivalidade entre as duas escolhas. Elas podem estar lado a lado tanto harmonicamente como opostamente. Exemplo: narra-se uma cena de amor com uma canção que remete à desilusão.

Talvez a forma ganhe muito mais importância do que o conteúdo quando se abdica inteiramente de se agarrar a uma história, a uma fábula, quando a proposta é construir sentido apenas com a associação de planos e montagem.

Como cinéfilo, gostaria de ter visto o esmero da câmera/fotografia/planificação refletido também na dramaturgia e no roteiro.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Para entender Xavier Dolan e “Os Amores Imaginários”


Depois de ter escrito sobre “Os Amores Imaginários” no Cineclick fiz uma rápida pesquisa na internet atrás de foto e me deparei com um texto da Carol Almeida, que escreve para o “Terra”, quando o filme de Xavier Dolan foi exibido no Rio.

Diz ela: “Pense num filme moderninho, casaquinhos da moda, vestidinhos retrô. Pensou? Agora duplique. Ou triplique. O fato é que o canadense 'Amores Imaginários', de Xavier Dolan, selecionado este ano da mostra Un Certain Regard, em Cannes, é certamente, entre todos os filmes do Festival do Rio, o título mais redondo para a turma que curte um combo cinema à noite + festa com trilha sonora indie na casa de algum conhecido (ou desconhecido) publicitário.”

Pimba, que capacidade de síntese. Ao ler isso entendi perfeitamente porque considero o filme de Dolan odioso, refrigerante de segunda linha que disfarça sua pobreza ao ser enlatado com uma pintura de Monet, filme pra ser consumido como se fosse combo de rede fast-food.

Pra começar, um esclarescimento: não acho o filme anterior de Dolan, “Eu Matei Minha Mãe”, uma lástima. Personagens histéricos, sim, mas de dores sinceras. No caso de “Os Amores Imaginários”, temos o suprassumo do cinema-consumo que se come e se bebe só na sala de cinema e, acabada a sessão, comenta-se com os amigos que é “legal”, “bonito”, “eu gostei”, “divertido”. Enfim, o cinema-nada.

Existem muitos filmes despretensiosos ou que almejam apenas divertir. Exemplo: “(500) Dias Com Ela”, mas com duas fortes diferenças: 1, tem-se personagens sinceros e espelhos de gente normal; 2, o diretor Marc Webb é tão sincero quanto seu filme, deixa claro que quer apenas divertir o espectador e não finge ser elaborado.

É odioso assistir a um filme como “Os Amores Imaginários”, cujos personagens saíram diretamente de páginas publicitárias, cuja narrativa depende de um irritante apêndice documental de tipos egoístas, cuja estética se apropria da vivacidade das cores pra vender ideias de plástico.

O filme de Dolan é tão falso quanto uma nota de três reais.

Michel Ciment e a crítica de cinema

Interessantíssima a experiência de assistir a “Michel Ciment: A Arte de Compartilhar Filmes” na Mostra. Ciment tem 72 anos, quase a idade de meu pai (76), é editor da revista “Positf” – rival histórica da “Cahiers du Cinéma” – e uma espécie de patrimônio cultural e cinematográfico francês.

No média-metragem, temos pessoas falando sobre Ciment e Ciment falando sobre cinema. Nada muito elaborado do ponto de vista formal, mas um filme que apresenta e sintetiza os principais pensamentos do crítico.

As ideias de Ciment sobre passado, presente e futuro do cinema, mas especialmente sua posição quanto à crítica, são fundamentais. Ainda mais para alguém jovem (25 anos), cuja cinefilia consciente foi despertada tardiamente (há cinco anos) e ainda está formando o olhar para o cinema.

No meu caso, ter a chance de ser confrontado com o pensamento de Ciment é fundamental. Não por colocá-lo num pedestal da perfeição intelectual e do bom gosto. Mas por duas razões: além do óbvio rigor por um filme, o Ciment apresentado pelo filme é um crítico intenso tanto para o amor quanto pelo ódio, algo que costumo defender; segundo: como alguém tem uma relação tão viva com o cinema mesmo depois dos 70?

O vigor de Ciment me lembrou a definição de Manoel de Oliveira para a busca de um artista: “a esperança é o que mantém a chama na busca pelo absoluto, que só vem na morte. O artista, a cada trabalho, busca o absoluto”. Talvez essa busca é o que ainda o deixe interessado em buscar novos realizadores (apesar de, por exemplo, eu não achar necessariamente um mérito Ciment ter defendido Lars Von Trier) é o que mantém viva relação Ciment/Cinema.

Para um jovem crítico de cinema, nascido nos anos 80 – momento de refluxo, convenhamos – é indispensável ter Ciment no coração. Um cara que dá a certeza de que a crítica de cinema é o que deve salvar o jornalismo cultural da mediocridade indicadora de consu