Cópia Fiel é uma equação que inexplicavelmente que dá muito certo. Um filme de rigor e precisão formal que, em vez de frigidez, exala em seus poros um âmago vultoso e amigável. Abbas Kiarostami nos apresenta uma obra de tremendo apuro estético e sentimental, filmado de maneira sublime com olhar cheio de frescor sobre uma relação amorosa. É belo pela forma e pela emoção, razão e coração.
Um filme aparentemente simples. Afinal, trata-se apenas de uma discussão na relação d’Ela (Juliette Binoche) com James (William Shimell). Ele, britânico, chega à Itália para lançar seu novo livro, Copia Conforme. É assim que Cópia Fiel começa: uma mesa com uma garrafa de água, dois microfones e um exemplar do livro. Não há ninguém para falar, apenas o zunzunzum do público que aguarda. Após atraso, James entra em quadro.
Enquanto versa opiniões sobre a essência do livro – onde está a originalidade ou a cópia na obra de arte? – Ela atravessa o quadro e se senta na primeira fileira. Quem é esta mulher? Eles se conhecem ou são estranhos? Com que direito acomodou-se num assento reservado? Por que, na presença do olhar curioso d’Ela, James não se abala e continua a desenvolver suas ideias sobre o novo ou a reprodução deste.
Durante a palestra, James diz que gosta da palavra “original” por conta de sua etimologia, que remonta a nascimento. Porém, “original” também é arquétipo e, mesmo a relação do casal do filme sendo, talvez, de mentira, ela é inteiramente verdadeira. Tudo depende do olhar. Uma relação, ao mesmo tempo, igual e particular, porque o cinema lhe deu esse status. Só o cinema para nos fazer compartilhar de uma história que, de tão comum no cotidiano, passa despercebida ao nosso redor.
As belas paisagens da Toscana tiram Cópia Fiel da ambientação sonora muçulmana para levá-lo a um registro praticamente novo na obra de Kiarostami, o cristão. Sinos badalam, o sotaque italiano afaga os ouvidos, o barulho dos pássaros nos exige uma outra colocação do tempo. A câmera passeia por construções históricas, cafés charmosos e espaços tradicionais de arte. “A Itália é um museu a céu aberto”, diz uma personagem.
Mas não se trata da câmera-cartão-postal, e sim de ambientação. Esta história de amor autenticamente imitada só faz sentido na Itália? Indiretamente, Cópia Fiel defende que sim, ao colocar que na Toscana, repletas de esculturas e pinturas, é pertinente esse questionamento formal, que responde não só ao enredo, mas ao próprio filme: como encontrar originalidade na linguagem cinematográfica se ela já alcançou desenvolvimento pleno há mais de cinquenta anos?
Assim, pouco importa que a relação de Ela com James ou o próprio filme não sejam os primeiros a existirem, mas que guardem um olhar vivo capaz de refrescar a percepção humana e cinematográfica. Como a maioria dos grandes filmes, Cópia Fiel fala da vida e do cinema. Fica até difícil dar conta de um filme com tantas portas apenas nesta crítica.
É a melhor obra lançada nesses primeiros meses de 2011 ao lado de Tio Boonmee, que Pode Recordar Suas Vidas Passadas. É filme para se assistir mais de uma vez: na primeira, surge o gosto; na segunda, o êxtase. Cópia Fiel me deixou extasiado.
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Um comentário:
É um filme espanta héteros: mulher de meia-idade que não sabe adestrar o próprio filho adolescente se joga para o primeiro que aparece e lhe empurra as derrotas da relação a dois anterior. O inglês foi muito tolerante,rs...
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